Uma vendedora da Seara Alimentos Ltda. deverá receber R$ 20 mil de indenização por ter sido dispensada dois meses após retornar de licença médica para tratar depressão.
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) levou em conta a frequente associação de estigma social aos transtornos mentais, inclusive o depressivo, o que leva o caso a se enquadrar no entendimento do Tribunal a respeito da dispensa discriminatória.
A vendedora foi contratada em abril de 2018 e dispensada um ano depois. Na reclamação trabalhista, ela disse que já sofria de depressão antes da admissão e que, em setembro de 2018, teve de retomar seu tratamento de forma mais intensa, levando-a a se afastar pelo INSS. Ao retornar, a empresa a colocou apenas para acompanhar outro vendedor até a dispensa. Segundo ela, a medida teve motivação discriminatória em razão de seu histórico de transtorno depressivo.
O juízo de primeiro grau entendeu que a doença, por seu caráter estigmatizante, se enquadrava na Súmula 443 do TST, e concedeu indenização por danos morais. O Tribunal Regional do Trabalho local porém, reformou a decisão, levando em conta que a trabalhadora havia sido considerada apta para retornar ao trabalho e que a depressão não estava relacionada ao ambiente laboral.
Empresa não comprovou outro motivo para demissão
O relator do recurso da trabalhadora, ministro Lelio Bentes Corrêa, com base no conjunto de provas, afirmou que foram comprovadas a gravidade do transtorno depressivo e sua natureza estigmatizante, bem como a ciência pela empresa do estado de saúde da trabalhadora. Nessas circunstâncias, presume-se discriminatória a dispensa, mormente sobretudo por ter ocorrido menos de dois meses após o retorno da licença de três meses para tratamento da doença.
Segundo ele, caberia à empresa comprovar que desconhecia a doença com a qual a empregada convivia por mais de 20 anos ou apontar um motivo lícito para a dispensa — o que não ocorreu.
Transtornos mentais geram estigma social
Com base na literatura médico-científica e em estudos no campo das ciências sociais, o ministro destacou que é frequente associação de estigma social aos transtornos mentais, e que isso é reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
O relator também ressaltou que o direito à não discriminação tem fundamento constitucional e está protegido por tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil, como a Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Por unanimidade, a Turma restabeleceu a sentença. (Com informações da Assessoria do TST)
Entenda o Caso: Demissão Após Licença por Depressão
A decisão judicial que obriga a Seara Alimentos a indenizar uma vendedora em R$ 20 mil lança luz sobre a delicada questão da discriminação no ambiente de trabalho, especialmente em relação a transtornos mentais como a depressão. A situação da vendedora, que foi dispensada apenas dois meses após retornar de uma licença médica para tratamento da doença, configura, segundo o Tribunal Superior do Trabalho (TST), uma dispensa discriminatória. Este caso ressalta a importância de as empresas adotarem práticas inclusivas e respeitosas, garantindo a saúde mental e o bem-estar de seus colaboradores.
O cerne da questão reside na presunção de que a demissão foi motivada pelo histórico de depressão da vendedora, e não por outros fatores legítimos. A empresa, por sua vez, não conseguiu comprovar que desconhecia a condição da funcionária ou apresentar uma justificativa plausível para a dispensa. Essa falta de justificativa, aliada ao curto período entre o retorno da licença e a demissão, fortaleceu a tese de discriminação, levando o TST a restabelecer a sentença inicial que condenava a Seara Alimentos a indenizar a trabalhadora. A decisão serve como um alerta para empresas de todos os portes sobre a necessidade de rever suas políticas de recursos humanos e promover um ambiente de trabalho livre de preconceitos e estigmas.
O Impacto da Depressão no Mercado de Trabalho
Estigma e Preconceito: Barreiras para Profissionais com Depressão
A depressão, assim como outros transtornos mentais, ainda é cercada por estigma e preconceito na sociedade, o que dificulta a inclusão e a permanência de profissionais que sofrem com a doença no mercado de trabalho. Muitas vezes, esses trabalhadores são vistos como menos produtivos, menos capazes ou até mesmo instáveis, o que pode levar à discriminação em processos seletivos, promoções e até mesmo na hora da demissão. É fundamental que as empresas combatam esses estereótipos e promovam a conscientização sobre a depressão, mostrando que ela é uma doença como qualquer outra e que pode ser tratada com sucesso.
Além disso, a falta de compreensão sobre a depressão pode gerar ambientes de trabalho hostis e desfavoráveis para quem sofre com a doença. A pressão por resultados, o excesso de trabalho, a falta de reconhecimento e o assédio moral podem agravar os sintomas da depressão e dificultar o tratamento. As empresas precisam criar um ambiente de trabalho mais acolhedor e solidário, oferecendo apoio psicológico, flexibilidade de horários e outras medidas que contribuam para o bem-estar mental de seus colaboradores. A conscientização e a educação são ferramentas cruciais para desmistificar a depressão e criar um ambiente de trabalho mais inclusivo e respeitoso.
O Papel das Empresas na Promoção da Saúde Mental
As empresas têm um papel fundamental na promoção da saúde mental de seus colaboradores, oferecendo programas de bem-estar, apoio psicológico e outras iniciativas que visem reduzir o estresse e melhorar a qualidade de vida no trabalho. Além disso, é importante que as empresas criem uma cultura organizacional que valorize a saúde mental, incentivando os colaboradores a buscar ajuda quando necessário e combatendo o estigma em relação aos transtornos mentais.
A implementação de políticas de recursos humanos que incentivem o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, a flexibilidade de horários e o trabalho remoto pode contribuir para a redução do estresse e da ansiedade, prevenindo o desenvolvimento de transtornos mentais como a depressão. Além disso, a oferta de treinamentos e workshops sobre saúde mental para gestores e colaboradores pode ajudar a identificar os sinais de alerta da depressão e a oferecer o apoio adequado. Ao investir na saúde mental de seus colaboradores, as empresas não apenas cumprem seu papel social, mas também aumentam a produtividade, reduzem o absenteísmo e melhoram o clima organizacional.
A Legislação Brasileira e a Discriminação por Doença
Súmula 443 do TST: Proteção contra Dispensa Discriminatória
A Súmula 443 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) é um importante instrumento de proteção contra a dispensa discriminatória de trabalhadores portadores de doenças graves que causem estigma ou preconceito. Essa súmula presume discriminatória a dispensa de empregado acometido de doença grave, como a depressão, cabendo ao empregador comprovar que a demissão não teve relação com a condição de saúde do trabalhador. A decisão do TST no caso da vendedora da Seara Alimentos reforça a aplicação dessa súmula e demonstra a importância de as empresas estarem atentas aos direitos dos trabalhadores com doenças estigmatizantes.
A Súmula 443 representa um avanço na proteção dos direitos dos trabalhadores com doenças graves, pois reconhece a dificuldade de comprovar a discriminação em casos de demissão. Ao presumir a discriminação, a súmula transfere para o empregador o ônus de provar que a demissão teve outros motivos legítimos, como desempenho insatisfatório ou reestruturação da empresa. Essa inversão do ônus da prova facilita o acesso à justiça para os trabalhadores que se sentem discriminados e contribui para a prevenção de práticas discriminatórias no ambiente de trabalho.
Convenção 111 da OIT: Proibição de Discriminação no Emprego
A Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil, proíbe a discriminação no emprego por motivos de raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social. Embora a Convenção não mencione explicitamente a discriminação por motivo de saúde, a jurisprudência tem interpretado que a discriminação por doença pode ser considerada uma forma de discriminação por origem social, já que a saúde é um fator que pode estar relacionado às condições de vida e ao acesso a serviços de saúde.
A Convenção 111 estabelece a obrigação dos Estados membros de promover a igualdade de oportunidades e de tratamento no emprego, eliminando qualquer forma de discriminação. Essa Convenção é um importante instrumento de proteção dos direitos dos trabalhadores e serve de base para a legislação brasileira que proíbe a discriminação no ambiente de trabalho. Ao ratificar a Convenção 111, o Brasil se comprometeu a adotar medidas para garantir a igualdade de oportunidades e de tratamento para todos os trabalhadores, independentemente de sua condição de saúde.
Como Identificar e Combater a Discriminação no Trabalho
Sinais de Alerta: Comportamentos Discriminatórios no Ambiente de Trabalho
Identificar a discriminação no ambiente de trabalho pode ser um desafio, pois muitas vezes ela se manifesta de forma sutil e velada. No entanto, alguns sinais de alerta podem indicar a ocorrência de comportamentos discriminatórios, como comentários ofensivos, piadas de mau gosto, exclusão de atividades sociais, tratamento diferenciado em relação a outros colegas, sobrecarga de trabalho, falta de oportunidades de promoção e demissão injustificada. É importante estar atento a esses sinais e denunciar qualquer forma de discriminação, seja ela direcionada a si mesmo ou a outros colegas.
Além dos sinais mais evidentes, a discriminação também pode se manifestar de forma mais sutil, como microagressões, que são comentários ou ações que expressam preconceito ou estereótipos negativos em relação a um determinado grupo de pessoas. As microagressões podem parecer inofensivas, mas, quando repetidas com frequência, podem causar um grande impacto na saúde mental e no bem-estar das vítimas. É fundamental que as empresas promovam a conscientização sobre as microagressões e incentivem os colaboradores a denunciar qualquer forma de comportamento discriminatório.
Mecanismos de Denúncia e Canais de Apoio
As empresas devem criar mecanismos de denúncia eficazes e acessíveis para que os colaboradores possam relatar casos de discriminação sem medo de retaliação. Esses mecanismos podem incluir canais de comunicação direta com o departamento de recursos humanos, ouvidoria interna, comitês de ética e canais de denúncia anônima. É importante que as empresas garantam a confidencialidade das denúncias e investiguem todos os casos com seriedade e imparcialidade.
Além dos mecanismos de denúncia internos, os trabalhadores também podem buscar apoio em órgãos externos, como sindicatos, Ministério Público do Trabalho, Defensoria Pública e organizações não governamentais que atuam na defesa dos direitos dos trabalhadores. Esses órgãos podem oferecer orientação jurídica, apoio psicológico e representação judicial em casos de discriminação. É fundamental que os trabalhadores conheçam seus direitos e saibam onde buscar ajuda em caso de discriminação no ambiente de trabalho.
O Caminho para um Ambiente de Trabalho Mais Inclusivo
Políticas de Diversidade e Inclusão: Boas Práticas Empresariais
A implementação de políticas de diversidade e inclusão é fundamental para criar um ambiente de trabalho mais justo e equitativo para todos os colaboradores. Essas políticas devem abranger diferentes aspectos, como recrutamento e seleção, treinamento e desenvolvimento, promoção e remuneração, e devem ser baseadas em princípios de igualdade de oportunidades e não discriminação. É importante que as empresas definam metas claras de diversidade e inclusão e monitorem o progresso em relação a essas metas.
Além de implementar políticas formais de diversidade e inclusão, as empresas também devem promover uma cultura organizacional que valorize a diversidade e o respeito às diferenças. Isso pode ser feito por meio de treinamentos e workshops sobre diversidade e inclusão, criação de grupos de afinidade, promoção de eventos culturais e incentivo ao diálogo aberto e honesto sobre questões de diversidade. Ao criar um ambiente de trabalho mais inclusivo, as empresas não apenas cumprem seu papel social, mas também atraem e retêm talentos, aumentam a produtividade e melhoram o clima organizacional.
O Poder da Conscientização e da Educação
A conscientização e a educação são ferramentas poderosas para combater o preconceito e a discriminação no ambiente de trabalho. As empresas devem investir em programas de treinamento e desenvolvimento que abordem temas como diversidade, inclusão, direitos humanos e combate ao assédio moral e sexual. Esses programas devem ser direcionados a todos os colaboradores, desde a alta administração até os funcionários de nível operacional.
Além dos programas de treinamento formais, as empresas também podem promover a conscientização por meio de campanhas internas de comunicação, palestras, debates e outras atividades que visem sensibilizar os colaboradores sobre a importância da diversidade e da inclusão. É fundamental que as empresas criem um ambiente onde os colaboradores se sintam à vontade para expressar suas opiniões e compartilhar suas experiências, sem medo de serem julgados ou discriminados. A conscientização e a educação são processos contínuos que exigem o compromisso de todos os membros da organização.
Consequências da Decisão para o Futuro
A decisão do TST no caso da vendedora da Seara Alimentos serve como um importante precedente para casos semelhantes, reforçando a proteção dos trabalhadores com transtornos mentais contra a discriminação no ambiente de trabalho. A decisão demonstra que a Justiça do Trabalho está atenta à questão da saúde mental e que as empresas não podem demitir seus funcionários com base em preconceitos ou estereótipos relacionados a transtornos mentais.
Além disso, a decisão pode incentivar outros trabalhadores que se sentem discriminados por causa de sua condição de saúde a buscar seus direitos na Justiça. Ao dar visibilidade a esse tipo de caso, a decisão contribui para a conscientização sobre a importância da saúde mental no trabalho e para a promoção de um ambiente de trabalho mais inclusivo e respeitoso para todos. É fundamental que as empresas estejam atentas a essa tendência e adotem medidas para prevenir a discriminação e promover a saúde mental de seus colaboradores.